29 January 2013

O Higgs gera a massa de tudo?

Higgs no CMS
Essa é uma pergunta que tem sido feita frequentemente depois da sensacional descoberta do Higgs. Para poder compreender o que acontece é necessário irmos devagar e entender vários aspectos importantes.

Primeiro é necessário compreender o que é massa. Na física Newtoniana estamos acostumados com a massa inercial que é uma medida de como um corpo responde quando uma força atua sobre ele. A segunda Lei de Newton nos diz que  a = F/m de forma que se aplicarmos a mesma força em dois corpos, aquele que tiver massa menor terá mais aceleração do que o corpo com massa maior. Usualmente usamos a força da gravitação para medir a massa quando colocamos o corpo sobre uma balança. Já na relatividade restrita massa é apenas uma forma de energia. Quando um corpo de massa m está parado ele possui energia de repouso dado por E = mc². Se ele estiver em movimento sua energia aumenta e vai depender da velocidade do corpo. Portanto, se conhecermos a energia de uma partícula parada sabemos a sua massa. Existem partículas de massa nula, como o fóton e os glúons, que movem-se sempre com a velocidade da luz. Não é possível para-las para medir sua massa. A massa delas é sempre zero.

O segundo conceito importante é o de campo. Estamos acostumados, por exemplo, com as linhas de campo magnéticos produzido por um imã como na figura ao lado. O campo magnético é sempre tangente as linhas de campo. Porém, quando a mecânica quântica é combinada com a relatividade restrita aprendemos que devemos associar um campo a toda partícula elementar. Por exemplo, existe um campo chamado campos de Dirac que permeia todo o universo. Quando esse campo recebe energia suficiente para ser excitado ele cria uma partícula associada a esse campo, que pode ser um elétron ou um pósitron (a anti-partícula do elétron). O campo eletromagnético cria partículas chamadas fótons que são as partículas de luz. O campo de quarks gera os quarks e assim por diante. A noção de campo é extremamente importante pois explica porque todos os elétrons são iguais, não importa se ele foram criados aqui no Brasil, no Japão, na Lua ou em alguma estrela distante. Todos são exatamente iguais porque são excitações do mesmo campo de Dirac. O mesmo raciocínio vale para o fóton, quarks e naturalmente para o Higgs. Portanto, quando se fala na partícula de Higgs devemos ter em mente que existe um campo de Higgs que quando excitado (como aconteceu no LHC) gera a partícula de Higgs.

Sabemos que uma partícula eletricamente carregada sente uma força quando colocada num campo elétrico, como na figura ao lado, e dizemos que há uma interação entre eles. Na linguagem de campos afirmamos que o campo de Dirac interage com o campo eletromagnético. Dessa maneira, os elétrons podem ganhar ou perder energia ao interagir com o campo eletromagnético.  Elétrons e prótons são partículas eletricamente carregadas que geram um campo eletromagnético e interagem entre si, podendo formar átomos de hidrogênio. Da mesma forma, o campo de quarks interage com o campo de glúons e podem formar um próton ou um nêutron. Essas interações entre campos e descrito por uma teoria quântica de campos. O modelo padrão das partículas elementares, que previu a existência do Higgs, é uma teoria quântica de campos.

Acontece que o campo de Higgs interage com os elétrons, os quarks, as partículas W e Z além de outras partículas de uma forma bastante peculiar. Ela transfere a energia do campo de Higgs para essas partículas na forma de massa. Lembre-se que massa é apenas uma forma de energia. Essas partículas elementares seriam partículas sem massa se o Higgs não existisse mas na presença do Higgs tornam-se massivas. As massas geradas dependem de como as partículas interagem com o Higgs e em geral são diferentes entre si. O modelo padrão das partículas elementares conseguiu, por exemplo, prever a massa dos W e Z antes de serem descobertos.

Poderíamos imaginar que como o Higgs gera massa para elétrons e quarks e como os quarks formam prótons e nêutrons, que por sua vez se combinam com os elétrons para formar átomos, então o Higgs geraria massa para tudo. Isso não é verdade. Num próton ou num nêutron, que são compostos por quarks interagindo com glúons, 99% da massa de um próton ou nêutron é gerado pela energia cinética dos quarks mais a energia de interação entre quarks e glúons. Lembre-se do início deste post, massa é uma forma de energia! A contribuição do Higgs para a massa de um átomo é de apenas cerca de 1%. Mas ele pode ser responsável por grande parte da matéria escura... que é outra história.


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