13 September 2006

Palestra de revisão

No ano passado dei uma palestra de revisão sobre teoria de campos no Encontro Nacional de Partículas e Campos. Escrevi um resumo do que apresentei para os proceedings mas o manuscrito foi devolvido pois querem que esteja escrito em ingles. Para não perder o que escrevi em portugues vou deixar uma cópia aqui. Note que se trata de uma visão pessoal da área.

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PALESTRA DE REVISÃO DE TEORIA DE CAMPOS

No Encontro de 2003 a palestra de revisão foi apresentada por Dionísio Bazeia Filho da UFPb. Ele fez uma comparação, bastante interessante e necessária, entre o número de trabalhos em teoria de campos apresentados naquela reunião, dividido por sub-áreas, e o número de trabalhos publicados nos arXives nessas mesmas sub-áreas. Grandes distorções foram detectadas. A maior parte dos trabalhos apresentados, 15%, eram em teoria de campos aplicado à matéria condensada enquanto nos arXives essa proporção é de apenas 1%. A área mais ativa, teoria de cordas, com 25% nos arXives, correspondia apenas à 8% dos trabalhos apresentados no encontro.

Não pretendo atualizar essa tabela. Dois anos é muito pouco tempo para que haja mudanças significativas. Porém, acho interessante comparar o que se faz no resto do mundo com o que se faz no Brasil.

No exterior, a área de teoria de campos é hoje dominada pelos pesquisadores de teoria de cordas. Entretanto, existe no Brasil uma grande comunidade que se dedica ao estudo da teoria de campos sem se preocupar com a teoria de cordas. Isso representa um aspecto preocupante pois falta modernidade aos pesquisadores que alheiam-se aos avanços produzidos pela teoria de cordas.

Os aspectos perturbativos da teoria de campos estão completamente compreendidos, quer em quatro, quer em duas dimensões. Infelizmente, ainda existe no Brasil um número considerável de pesquisadores que continuam nessa área. A única linha que ainda necessita pesquisa é o cálculo de amplitudes de espalhamento, principalmente nas teorias de gauge não abelianas. Técnicas que permitam o cálculo de amplitudes para muitas partículas ou envolvendo vários loops ainda estão em desenvolvimento. Técnicas de teoria de cordas estão sendo extremamente úteis.

O grande problema real na teoria de campos é a compreensão do setor não perturbativo. O cálculo do espectro das teorias de gauge não abelianas, a demonstração do confinamento da QCD, o problema das cópias de Gribov, o estudo das dualidades, a expansão 1/N e cálculos na rêde, são os tópicos mais importantes. Felizmente, vários grupos brasileiros ocupam-se desses problemas.

Outro tema já bastante difundido no Brasil é o estudo de teoria de campos não comutativa. Existem vários grupos trabalhando em diversos aspectos dessas teorias distribuídos pelo Brasil. Também importante é a teoria de campos em espaços curvos. Alguns grupos brasileiros tem interesse nesse tópico. A teoria de campos à temperatura finita também é outra linha em que temos vários grupos, porém não há grande movimentação nessa área no exterior. As aplicações à matéria condensada é outra linha nessa mesma situação. Já o estudo do efeito Casimir e o uso de condições de contôrno em teoria de campos representam linhas com grande número de brasileiros envolvidos e que também tem tido grande desenvolvimento no exterior.

Uma parcela significativa da comunidade dedica-se ao estudo da integrabilidade em teoria de campos, principalmente em duas dimensões. Deve-se chamar a atenção para o fato de que hoje em dia há indícios de que a teoria de campos maximalmente supersimétrica é integrável. Há, também, uma forte conexão com a integrabilidade da teoria de cordas em determinados backgrounds. Infelizmente, não há ninguém no Brasil desenvolvendo essa linha.

Uma nova área aberta pela teoria de cordas e pela loop quantum gravity é a chamada violação de Lorentz na teoria de campos. Na verdade, não se trata da violação da simetria de Lorentz, mas no estudo da teoria de campos quando algum vetor ou tensor adquire um valor esperado no vácuo. Trata-se de uma área em expansão e que atrai algumas poucas pessoas no Brasil.

Sem dúvida a teoria de cordas representa o próximo passo a ser desenvolvido após o sucesso da teoria de campos . Entretanto, o número de pesquisadores brasileiros nessa área ainda é extremamente reduzido. Trata-se de uma área dinâmica e extremamente competitiva e talvez isso explique o retraimento de nossa comunidade. O cálculo de amplitudes é uma das poucas áreas desenvolvidas no Brasil. Teoria de campos de cordas, modêlos matriciais e teoria de cordas topológicas são linhas inexistentes no Brasil mas de grande atividade no exterior. A fenomenologia de cordas, e principalmente o estudo da landscape, são outras linhas de grande atividade no exterior e só agora alguns pesquisadores brasileiros começam a tomar interesse. As diversas cosmologias baseadas na teoria de cordas, como braneworlds, Randall-Sundrum, dimensões extras e ações efetivas da teoria de cordas envolvem alguns grupos brasileiros e parece que aos poucos tais grupos estão se consolidando.

Entretanto, a grande movimentação que ocorre hoje em dia na área é devido à correspondência AdS/CFT, ou mais genericamente, a correspondência gravitação/teoria de gauge. O cálculo do espectro em teorias de gauge envolve alguns pesquisadores brasileiros. Como mencionado anteriormente, a linha que está em crescimento, entretanto, é a do estudo da integrabilidade dos dois lados da correspondência. Infelizmente essa é uma linha que ainda não é desenvolvida no Brasil.

Espero ter traçado um perfil dos trabalhos apresentados neste encontro, comparando-os com as linhas mais importantes que estão sendo desenvolvidas no exterior. Temos muitos grupos envolvidos nessas linhas mais dinâmicas mas ainda temos um número significativo de pesquisadores trabalhando em assuntos não tão importantes. Espero que a médio prazo esse quadro possa ser modificado de maneira positiva e possamos estar contribuindo para a solução dos grandes problemas de nossa área.

Apenas algumas referências básicas foram supridas.

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