É lamentável a confusão que ainda existe sobre o tripé ensino, pesquisa e extensão na universidade. E é mais preocupante quando ela se manifesta através do Jornal da USP. O artigo do prof. Prouvot, A docência no ensino, pesquisa e extensão, é um exemplo claro. Esse texto afirma que "Mesmo que o professor não seja um pesquisador na verdadeira acepção do termo, necessita ler, estudar e se atualizar constantemente para sua função de professor, e precisa, até por determinações estatutárias, realiza-las e publica-las." Um professor que não é pesquisador mas atualiza-se constantemente é, de fato, um bom professor, um professor zeloso e capaz. Mas como ele não é pesquisador, seu lugar não é numa universidade mas sim numa escola superior (ou centro universitário, de acordo com o anteprojeto de lei da reforma universitária). É bom lembrar que a universidade caracteriza-se pela geração e transmissão do conhecimento enquanto a escola superior cuida apenas de sua transmissão. E é bom salientar que não são apenas os institutos de pesquisa que geram um saber novo, mas que esse é um dos objetivos fundamentais de qualquer universidade digna desse nome. Voltando ao texto, coitado do professor que realiza atividades de pesquisa porque assim lhe é exigido. A pesquisa, da mesma forma que o ensino, deve ser realizada pelo prazer intelectual que isso gera e não por mera obrigação.
Continuando, o prof. Prouvot afirma: "Entretanto, todas essas exigências não podem suplantar a sua função docente, que é confundida de certo modo, com a extensão, que, em uma análise mais ampla, é o grande objetivo da universidade". Aqui se dá a confusão fundamental. O objetivo imediato da universidade é a formação de mão de obra qualificada. São os alunos que preparamos para assumirem postos profissionais altamente qualificados. A pesquisa, por sua vez, pode não ter retorno imediato. Muitas vezes são necessários anos para que algo descoberto no laboratório de uma universidade chegue à sociedade. E a extensão é tudo aquilo que fazemos e que não pode ser qualificado nem de ensino e nem de pesquisa. Nem porisso a extensão é menos importante, e certamente constituiu um elo fundamental entre a universidade e a sociedade. E é claro, alunos que aprendem com pesquisadores muma universidade são muito melhores do que aqueles formados por professores num centro universitário. É exatamente porisso que os formandos da USP são sempre muito disputados pelo mercado de trabalho. Isto tudo mostra a importância do ensino, pesquisa e extensão, que quando realizados em conjunto e de forma competente promovem a valorização da universidade e contribuem de maneira fundamental para formação de uma sociedade maiz capacitada em todos os sentidos.
4 comments:
Lamentável mesmo é a universidade não quer um professor que pesquise, e sim um pesquisador que também ensine. O artigo do prof. Prouvot está perfeito. Durante meu curso de graduação cansei de ter pesquisadores que “ensinavam” e raríssimos professores que pesquisavam, os primeiros não formam livres pensadores os segundos sim. É bom se ler o artigo (Repensando o ensino, http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=35878) do físico Marcelo Gleiser publicado na Folha de São Paulo no dia 12/03/2206, que como era de se esperar não foi comentado no presente blog. A maioria dos pesquisadores que conheço, sejam bons ou péssimos, não sabem o que é uma aula, não sabem o que é uma formação humana. Também conheço alguns professores (com dedicação exclusiva) que por vários motivos abandonaram a pesquisa científica e continuam sendo excelentes professores, mas na verdade acho que, se estão fazendo pelo menos pesquisas em ensino nas suas áreas de formação e atuação, deveriam estar em instituições de ensino superior.
Lugar de pesquisadores que não têm, nem querem procurar ter, habilidades pedagógicas não é na universidade e sim, como diz o artigo em questão, em centros de pesquisas. Quem se atreve a continuar na universidade deveria se tocar e rever o verdadeiro papel de um professor universitário.
Mais uma observação: conhecimento não é gerado nem transmitido, esse tipo de coisa é irresponsável, o conhecimento é, e deve ser, construído de forma responsável e humana, a humanidade já está muito “grandinha” para fazer isso!
Concordo plenamente que professores universitários devem ser pesquisadores, pois além de todo conhecimento construído a partir de suas pesquisas eles são os únicos que têm habilitação real para compartilhar com seus alunos (independente da área de formação e futura área de atuação) o conhecimento de forma atualizada e suas perspectivas, pois estão vivenciando o estado-da-arte de suas respectivas ciências. Porém, o que não pode ocorrer é o descuido com o ensino e a formação humana dos futuros profissionais, e isso é o que sempre aconteceu, e continua acontecendo, nas maioria de nossas universidades.
Profissionais altamente qualificados e sem formação humana são simplesmente monstros. O mercado de trabalho não está nem aí para a formação humana, e a universidade, simplesmente produzindo mão de obra qualificada (e desumana) para esse mercado, pode até estar contribuindo de maneira fundamental para formação de uma sociedade mais capacitada, mas não no sentido humano do termo. Pense nisso prezado professor Rivelles.
Caro Krishna,
O artigo do Prouvot revela o caminho que uma universidade não deve trilhar. Vejamos porque.
Durante meu curso de graduação cansei de ter pesquisadores que “ensinavam” e raríssimos professores que pesquisavam, os primeiros não formam livres pensadores os segundos sim.
Voce teve muita sorte de ter pesquisadores como professores. Coitados dos outros brasileiros que pagam por um curso superior e quando fazem um mero exame para receberem a autorização para exercer sua profissão são reprovados. Veja o que acontece nos exames da OAB. Além disso, voce prefere ser atendido por um médico formado na USP ou por um formado numa faculdade de fundo de quintal? A qualidade é tudo.
A maioria dos pesquisadores que conheço, sejam bons ou péssimos, não sabem o que é uma aula, não sabem o que é uma formação humana.
Voce está confundindo duas coisas. Didática e formação humano. Quem será que o ensinou a confundir coisas distintas, hein? Conheço muita gente com boa didática e com péssima formação humana! Diria até com problemas de caráter. Minha experiência é exatamente contrária. Todos os bons pesquisadores que conheço tem ótima formação humana.
Lugar de pesquisadores que não têm, nem querem procurar ter, habilidades pedagógicas não é na universidade e sim, como diz o artigo em questão, em centros de pesquisas.
Concordo com voce. Pesquisadores que escolhem a universidade devem se preocupar com o ensino. E muito. Além disso, professor que só se dedica ao ensino na universidade e não faz pesquisa, também está no lugar errado. Deveria sair da universidade.
conhecimento não é gerado nem transmitido, esse tipo de coisa é irresponsável, o conhecimento é, e deve ser, construído de forma responsável e humana, a humanidade já está muito “grandinha” para fazer isso!
Abra os olhos para a realidade. A transmissão de conhecimento técnico é sempre difícil e usualmente árido. Não há como fugir disso. Qualquer um que diga o contrário ou está mentindo ou não tem conhecimento técnico. Na universidade há muita gente nesta última categoria. Por outro lado, se voce quer aula bombom, então o problema é seu. A maioria prefere um professor competente e com conhecimento.
Profissionais altamente qualificados e sem formação humana são simplesmente monstros.
Mais monstruoso é ser enganado por falsos professores que dizem ensinar e não ensinam. Fale com algum reprovado no exame da OAB.
Pense nisso Krishna!!!
Victor
Caro professor Rivelles,
deixei bem claro que concordo plenamente que os professores devem ser pesquisadores, mesmo assim são raros (uns 25% no máximo por essas bandas) os professores que são realmente educadores e pesquisadores. Todo o resto vê-se claramente que se pudessem não entrariam em uma sala de aula, os caras são péssimos.
Também concordo que a qualidade é tudo, mas formar robôs de qualidade não vale a pena, a educação tem uma dimensão muito maior que simplesmente a científica, a educação tem dimensão social.
Não estou confundindo didática e formação humana, pode-se se ter didática para se instruir (como se faz nos quartéis ou nas escolas do SENAI), mas instrução não é educação, o senhor deve se lembrar de uma passagem do pequeno texto de Luiz Freire que lhe enviei: “Quando se educa, se instrui, mas quando se instrui, não se educa. A razão está no fato da educação se referir aos cultivos físico, intelectual e moral (é preparar o indivíduo para a vida completa, diz Spencer, da educação), enquanto que a instrução só se refere ao cultivo intelectual.”. Didática em educação é algo muito mais abrangente do que didática em instrução. Instrução não pule as pessoas, educação sim!
Não conheço um só professor que tivesse boa didática e não fosse uma pessoa, com excelente formação humana, todos meus bons professores, além do esmero no preparo de suas aulas, mostravam-se preocupados em falar sobre a didática que deveríamos ter com nossos futuros alunos, além de dialogarem também sobre a dimensão social da educação.
Esse é o termômetro que aprendi a utilizar para saber quando um professor tem ou não boa índole, e diga-se que não errei em uma só aferição até agora.
Tive vários instrutores também, uns poucos até com alguma didática em suas seções de instrução, mas não passavam disso: instrutores.
Os professores universitários no Brasil (em sua maioria) não têm formação alguma em educação, seja na graduação ou na pós-graduação, e isso é uma aberração. Não têm formação em educação e muito menos em algo que tente humanizá-los (não os tornarem complacentes), por favor, veja este artigo (http://www.hfleming.com/papers/inter.html)do professor Henrique Fleming, por ironia do destino os livros (Great Books) que estão na primeira estante da biblioteca de Física e Química aqui da UFPE são exatamente os citados no artigo acima, livros estes que raramente são abertos por alguém. Isso só foi um exemplo da formação universitária irresponsável que é dada nas universidades Públicas do Brasil. Apesar da pós-graduação daqui (DF) ser nível 7, vejo que meus colegas só sabem resolver listas de exercícios e como muito auxílio dos manuais de solução, portanto essas avaliações da CAPES estão um tanto furadas. E talvez a da OAB também esteja precisando aumentar mais o nível para expurgar de vez essas piadas de mau gosto que são os cursos de direito das instituições privadas de ensino superior, e também quem sabe não mostre a real situação de algumas universidades públicas. Cheguei a ler a carta que o professor Carlos Barata enviou a todos os docentes do IF-USP tratando da situação do ensino e percebi que com maior ou menor gravidade o IF-USP padece dos mesmos males que o DF-UFPE, se não tivesse essa informação nem estaria fazendo comentários aqui, pois não é necessário abrir os olhos de quem vive em um eterno mar de rosas.
É óbvio que a transmissão de conhecimento técnico é sempre difícil e usualmente árida, mas há sim como melhorar em muito isso, primeiramente trocando-se a simples tentativa de transmissão de conhecimento pela tentativa de compartilhamento do mesmo, já que cada indivíduo pode ter uma interpretação (não necessariamente incorreta) do que acaba de escutar, ver ou praticar. Mais claro ainda é que professores incompetentes e sem conhecimentos (em pesquisa) não servem nem como instrutores.
“Quem será que o ensinou a confundir coisas distintas, hein?”
Essa foi boa. Ninguém me ensinou nada, ninguém ensina nada a ninguém, ou você aprende por si só ou está em maus lençóis. O que eu (que nunca tive dificuldades de aprendizado, pois tenho o conhecimento como prazer pessoal) aprendi ao longo de minha graduação ao ver muitíssimos colegas com cara de vaca atolada ao meu redor durante uma aula sem entender bulhufas e com receio de perguntar e questionar o “instrutor”, ou mesmo sem nem ter estrutura para formular uma pergunta, e que depois não conseguiam resolver as famosas listas de exercícios, pois mesmo lendo os textos ainda não conseguiam entender a essência do assunto, foi que algo precisa ser feito e com urgência enquanto ainda há tempo de salvar alguma coisa em nosso planeta.
Prezado professor Rivelles, vos enviarei pelo correio eletrônico um livro de Paulo Freire (cópia digitada e original digitalizado, com aproximadamente 100 páginas) e peço-lhe com encarecimento que se desarme e o leia, garanto que irá valer a pena, também vos enviarei o artigo do Marcelo Gleiser que citei no primeiro comentário a esse post.
"Eu sou um intelectual que não tem medo de se amoroso, eu amo as gentes e amo o mundo. E é porque amo as pessoas e amo o mundo, que eu brigo para que a justiça social se implante antes da caridade."
Paulo Freire
Caro Krishna,
Voce insiste muito em "humanizar" o ensino universitário, sem perda de qualidade, e que a função do pesquisador é compartilhar o que ele sabe. Concordo integralmente com voce. O que acontece é que não há como fazer isso na prática. A quantidade de informação a ser repassada aos estudantes é enorme e não há tempo suficiente para discutir com os alunos os assuntos tratados. A transmissão informação ocorre apenas num sentido, infelizmente. Os alunos devem se organizar e discutir entre eles. E se tiverem dúvidas insuperáveis, pedir auxílio ao professor. Nos cursos de pós ocorre o mesmo. A situação melhora um pouco quando voce começa a trabalhar no projeto de pesquisa pois aí é necessário discutir com o orientador e há um verdadeiro compartilhamento, nos moldes que voce sugere.
Poderíamos nos perguntar se não existe maneira melhor de fazer isso e a resposta é, não existe. A Europa e os EUA tem muito mais tradição no ensino universitário do que nós e ainda não descobriram forma mais eficiente. E voce parece ser suficientemente esclarecido e esperto para saber que não existem fórmulas mágicas.
Voce cita constantemente Paulo Freire. Confesso que li muito pouco do que ele escreveu mas sempre tive a impressão de que ele trata do ensino fundamental e médio, onde a formação humana é essencial para a edificação de um cidadão consciente. O que ele fala, entretanto, não tem como ser aplicado no ensino de graduação e muito menos no de pós pelos motivos que expus acima.
Victor
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